sábado, dezembro 28, 2013

INTEGRALISMO. FASCISMO. NAZISMO. ANALOGIAS E CONTRASTES.

A.Machado Paupério e J. Rocha Moreira

(...)
Não se veja, entretanto, no Integralismo, um fascismo ou um nazismo mascarado, como o apontam os liberais e os comunistas.
O Integralismo, consoante suas analogias com o fascismo e o nazismo, deles se afasta, entretanto, em certos pontos, de modo radical, sabendo-se condicionar, quando procura resolver os problemas brasileiros, ao ambiente e às necessidades nacionais.
Vejamos em que se pode identificar de um modo geral o Integralismo com os movimentos nacionalistas europeus:
a)         Pelo espírito de reação espiritualista, pelo qual se procura combater o vírus materialista que tem avassalado as novas gerações e tirado da alma do povo toda a capacidade idealista e construtora. Reação de caráter espiritualista, do fascismo e do nazismo, afasta-se, entretanto, o Integralismo por não aceitar os princípios de absorção estatal e racial que estão levando aqueles regimes à paganização.
b)         Pelo espírito de reação nacionalista, pelo qual se procura processar o combate ao internacionalismo bolchevista desnacionalizante. Por espírito nacionalista, não se entenda, porém, exclusivismo jacobino. Seria absurdo. O Integralismo, “ao invés de internacionalista” acha, como diz magistralmente Gustavo Barroso, que “o homem deve ser equilibradamente, regionalista, pelo seu amor ao pequenino canto e ao limitado número de pessoas de seu berço, patriota, pelo alargamento inteligente de seu sentimento sobre a terra do país natal, comungando com o meio físico e étnico nos mesmos interesses e nos mesmos sentimentos; universalista pela irmanação do seu espírito ao grande espírito da espécie, ao sentimento comum da Humanidade de que participa. Ser somente regionalista é um erro, ser somente patriota, outro e ser somente universalista, outro. É necessário ser suficientemente os três. Porque nenhum deles bem entendido colide com os outros e todos levam à mesma ascensão espiritual”. (1)
c) Pelo espírito de reação anti-individualista, pela qual se combate o espírito desagregador e atômico da atual sociedade burguesa. O Integralismo pretende ser uma democracia social, de modo a acabar com o absolutismo do indivíduo. Por isso, defende, como o fascismo, a organização corporativa da sociedade e a implantação do Estado Corporativo de base integral e orgânica, defendendo também, como o fascismo, o princípio da economia dirigida, único meio eficaz de levantar economicamente a nação e de acabar com o antagonismo e a luta de classes, criada pelo liberalismo econômico.
Não obstante os grandes pontos de contato com o regime fascista, regime nacionalista por excelência, dele diferencia-se, entretanto, o Integralismo de modo radical quanto ao seu regime de governo e à sua concepção de Estado.
Quanto ao regime governamental, o Integralismo, ao contrário do que se dá com o Fascismo, apresenta caráter democrático, através embora de sua nova organização corporativa. Enquanto no Fáscio são os representantes sindicais escolhidos mediante indicação do Estado, no nosso Integralismo são os próprios sindicatos, as próprias federações e as próprias corporações que elegem pelo voto os seus representantes ao governo da Nação. Mantemos assim a forma republicana do país, em oposição flagrante à forma governamental italiana. À centralização política opomos mais, em contraste com a Itália, a descentralização administrativa, mantendo assim a autonomia dos municípios, dentro da Federação. E para integrar todos os elementos nacionais no governo do país, reconhecemos ainda, além da representação econômica, a representação política técnica.
Não é, porém, pelo regime governamental, que mais se afasta o Integralismo do Fascismo, mas, sobretudo pela sua concepção de Estado.
O fascismo apresenta uma tendência imanente ao estatismo ou ao que Pio XI chamou estatolatria.
Reagindo contra o Estado liberal impotente, caiu o Fáscio no exagero que deveria ter evitado: tornou-se totalitário.
“Nada fora do fascismo” – “Tudo dentro do Estado, nada fora do Estado, nada contra o Estado”, é a afirmação categórica de Mussolini.
A concepção do Fáscio parece ter feito do Estado um verdadeiro tabu, um verdadeiro absoluto.
Rocco, o próprio ministro da Justiça da Itália, não esconde esse espírito de absorção estatista do regime quando faz a apologia da absorção do indivíduo pela sociedade.
“Os velhos sistemas, diz ele, ignoravam que os indivíduos tomados isoladamente têm um valor quase nulo, apesar disto ser uma realidade na vida social” e noutro ponto: “a sociedade deve ser considerada na continuidade da sua existência que ultrapassa a dos indivíduos, elementos transitórios. Ao predomínio do indivíduo sobre a sociedade, substituiu-se o predomínio da sociedade sobre o indivíduo”. (2)
Por certo negamos a concepção de Rocco. Se rejeitamos o predomínio do indivíduo sobre a sociedade, também rejeitamos o predomínio da sociedade sobre o indivíduo. O absolutismo social parece-nos tão perigoso quanto o absolutismo individual. A sociedade, à luz de uma concepção integral, não é um fim em si, mas um meio pelo qual o indivíduo deve atingir a plenitude. A sociedade não pode, portanto, absorver o indivíduo: deve-lhes mesmo respeitar os direitos inerentes à sua qualidade de pessoa humana. (3) O Estado cristão deve ser até, como diz Maritain, “tão fundamentalmente anti-individualista quando fundamentalmente personalista”. (4)
Só assim, livrar-se-á ele do individualismo liberal e do estatismo totalitário, absorvente da personalidade.
O fascismo, tirando, por exemplo, da família a faculdade da educação dos filhos e tolhendo a liberdade de associação religiosa, como aconteceu por ocasião do fechamento das associações católicas da juventude, mostra-nos à evidência o caráter absorvente do Estado italiano que devemos a todo transe combater. Esse caráter, que se tornou um verdadeiro endeusamento do Estado, fez do fascismo uma verdadeira religião. Não somos nós quem o afirmamos. É o próprio Gentizou, num dos seus notáveis telegramas ao “Temps”:
“Com o fascismo, nasceu na Itália uma nova religião. Na verdade, nada tem de eclesiástica. É até uma religião civil, pode dizer-se, mas que não deixa, por isso, de ter um culto completo. A divindade é a Pátria, não aquela que os teólogos constantemente têm colocado no céu, a Pátria celeste, mas a terrestre e transitória do homem. A veneração que lhe manifestam comporta uma completa terminologia sagrada. Lede os jornais fascistas, em todas as páginas aparecem às expressões: Itália santa, Itália divina. Os mortos pela Pátria ou na Revolução dos Camisas negras são os mártires dum ideal de que eram os apóstolos. Em sua homenagem erguem-se altares, acendem-se chamas votivas, celebram-se ritos, etc. Fala-se dos lugares santos da Pátria e os novos obedecem a decálogos e a credos que, bem entendido, nada têm que ver com os dez mandamentos da Lei de Deus. Essa curiosa transferência do estilo litúrgico para o campo profano dos sentimentos, dos fatos e dos acontecimentos de caráter civil chega a ter efeitos ainda mais singulares. Um dia é uma revista encarregada de espalhar pelo mundo a ideia italiana, que intitula um dos seus artigos de propaganda fide. Noutra ocasião é um jornal de província que qualifica o Duce de nosso deus, o deus duma magnífica fé que tem os seus mártires, os seus confessores e os seus heróis”. (5)
O fascismo tornou-se, assim, uma verdadeira religião, em tudo digna do naturalismo do século.
Um dos lugares-tenentes do Duce, Bottaï, ministro das Corporações, dizia-o ainda recentemente:
“Assim como um católico não discute os dogmas da sua fé, também nós não discutimos os dogmas do nosso credo fascista”. (6)
Aliás, “Mussolini tem sempre razão”, já o dizia um dos mandamentos do miliciano fascista.
Fetichismo intolerante e intolerável, talvez necessário para uma nova divinização do Estado, à maneira do antigo império romano.
Aliás, parece que a alma imperialista da Roma dos Césares refloresce novamente no espírito da Itália Nova. A águia romana na morreu. Parece mesmo perdurar através da orientação criminosamente guerreira que a Península vem dando à educação de seus folhos.
Já o próprio Mussolini, em discurso pronunciado em 25 de Maio de 1929, ousava dizer: “Não podemos renunciar a essa educação a que daremos, finalmente, o verdadeiro nome, pois nos repugna a hipocrisia: a educação guerreira, a palavra não nos deve assustar”. (7)
Até a apologia da guerra parece fazer-se. Pelo menos, num discurso dirigido aos novos, dizia o ministro da instrução pública, em 25 de Março de 1928:
“Ah! Como será bela a guerra que vós fareis, a guerra na qual sentireis dentro de vós e atrás de vós toda a Itália unida, que vos ajudará, vos acompanhará e vos beijará a fronte, em recompensa da vossa vitória!”. (8)
Em lugar da concórdia e da confraternização, chega-se a elogiar o próprio ódio. Assim, falando aos estudantes da Universidade de Pádua, diz-lhe o professor Bodrero, vice-presidente da Câmara dos Deputados e antigo vice-ministro da Instrução Pública: “Há uma virtude que deve ser o vosso estimulante, que deve ser a chama da vossa juventude e essa virtude chama-se ódio”. (9)
Evidentemente não podemos bater palmas a essa culposa orientação com que se prepara à geração italiana de amanhã.
A própria infância foi militarizada. A organização dos Balilas constitui, por assim dizer, uma organização pré-militar. Desde cedo se adestra, assim, a criança no manejo das armas de que receberá até exemplares artificiais. O gênio guerreiro parece invadir a Itália Nova.
De modo nenhum justificamos “esse espírito que prepara as crianças para a conquista e forma os conquistadores”, espírito censurado pelo próprio Papa em discurso público de 14 de Maio de 1929.
(...) Sob o influxo do Cristianismo, pugnamos por uma educação mais racional, mais pacífica e, sobretudo mais humana.
Nesse ponto de vista, coloca-se o Integralismo, dentro de sua concepção orgânica e espiritualista da vida.
A crítica que fizemos ao Estado fascista, estendemos ao Estado nazista, cujo espírito totalitário se denota ainda de modo muito mais intenso e revoltante.
Ao totalitarismo de Hitler acresce, porém ainda, na Nova Alemanha, a política racista, de fundo profundamente materialista e anticristão.
Baseado numa pretensa superioridade do ariano, proclamada pelas teorias, hoje caducas, de Chamberlain e Gobineau (10), desencadeou o nazismo a luta racial, movendo contra todos os não arianos a mais acentuada e ignóbil campanha.
Nós, graças a Deus, não temos preconceitos de raça. À luz da comunhão cristã, não distinguimos pigmentos nem caracteres cranianos.
Somos mesmo o produto do caldeamento de três raças (branca, negra e indígena) que se fundiram e que permanecem ainda em continuada evolução. Não temos ainda um tipo brasileiro. Além disso, povo novo, não podemos ainda dispensar o concurso imigratório. Mister é povoarmo-nos, se queremos a nossa vida e a nossa grandeza.
Por tudo isto, e principalmente pelo ideal cristão que nos anima, jamais fizemos campanha racista. À diferença étnica opomos a igualdade espiritual de todos os homens.
Brancos e negros, caboclos e mamelucos, jagunços e caudilhos, todos são brasileiros, capazes de cooperar com a sua parcela de esforço, de coragem e de dedicação na obra de reconstrução da Pátria.
Se o índice étnico os separa, o espírito os irmana.
Dentro do nosso caráter cristão não há lugar para antagonismos e preconceitos raciais. Esse caráter que se revela a cada passo na concepção do Integralismo é o grande motivo de sua superioridade e de sua vitória.
Quando morrer a civilização da velha Europa e se realizar o sonho de Keiserling, através da grandeza da Nova América, será esse caráter para o mundo o despertar de novas energias, sob o influxo das quais talvez se abrande o paganismo hodierno dos povos decrépitos. Pois, como diz Plínio, “enquanto os demais povos se movimentam no sentido do Estado Forte, nós vamos mais longe, porque desejamos o Estado Integral, que contém todas as forças e representa o equilíbrio perfeito.
“O Estado Forte é a transição para o Estado Integral. Um dia, a Europa virá aprender com o Brasil.
“Do Continente Sul-Americano sairá à palavra de ordem. Essa palavra é a mesma que está realizando o maior movimento do mundo atual, como extensão geográfica e o mais profundo como significação cultural e espiritual.
“No limiar do século XX, alvorece a Civilização Atlântica. É a voz da América pela voz da Pátria Brasileira”. (11)

NOTAS:
1 -  Gustavo Barroso – O QUE O INTEGRALISTA DEVE SABER.
2 - G. Roux – ORGANIZAÇÃO DO ESTADO NOVO ITALIANO.
3 - No homem distinguimos o indivíduo e a pessoa. Como indivíduo, isto é, como átomo do organismo social, deve o homem subordinar-se à sociedade, sacrificando mesmo o seu bem individual ao bem superior da coletividade. Como pessoa, porém, isto é, como realidade espiritual individuada e distinta, é o homem dotado de direitos imprescritíveis e inalienáveis que devem ser, por certo, respeitados pelo Estado.
4 - Jacques Maritain – TROIS RÉFORMATEURS.
5 - G. Roux – Op. Cit.
6 - G. Roux – Op. Cit.
7 - G. Roux – Op. Cit.
8 - G. Roux – Op. Cit.
9 - G. Roux – Op. Cit.
10 - O racismo apoia-se, sem dúvida, sobre teorias passadistas e unilaterais. Hoje reconhece a ciência moderna que não é a raça o único fator concorrente da superioridade de um povo. Inúmeros outros fatores (e entre eles o geográfico, o histórico, o econômico, o educacional, o religioso, etc.) concorrem, além, além do índice étnico, para essa superioridade.
11 - Plínio Salgado – A QUARTA HUMANIDADE.

A.Machado Paupério J. Rocha Moreira: “Introdução ao Integralismo”. Rio de Janeiro, Record, s/d. Transcrição das págs. 169 até 182.

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