sábado, fevereiro 23, 2008

A TUA CRUZ, SENHOR...

Plínio Salgado

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Ela tem a forma de um homem de braços abertos e em posição vertical. Ela se firma na terra, ergue a cabeça para o Céu e estende os dois braços horizontalmente, como a abranger toda a Humanidade.

Não podias mesmo ter a morte dos condenados ao veneno, como Sócrates, nem dos que foram compelidos a cortar as veias, como Sêneca, porque aquela representa o homicídio pela ciência, e a ciência jamais te matará, e esta é o suicídio forçado a que se subordinam os estóicos materialistas e tu és a expressão mais sublime do sentido espiritual da existência.

Sócrates e Sêneca rolam por terra ao morrer. Tu, porém, devias estar de pé na tua agonia e mesmo depois de morto. E não apenas de pé, mas erguido no madeiro; e não somente erguido no madeiro, mas levantado no cume de um monte; e não só levantado na montanha, mas abarcando os horizontes com teus braços num abraço universal.

Não podias também morrer pela forca, pois o patíbulo forma apenas um ângulo reto, sendo corpo de um só braço e figura curvada para a terra, sem cabeça que se erga para o Infinito; ao passo que a Cruz compõe quatro ângulos retos, ou seja 360 graus, isto é, a circunferência, misterioso símbolo da Eternidade e de Deus, sem princípio nem fim.

Não podias sofrer a morte por degolação, como padeceram muitos de teus discípulos e numerosíssimos inocentes e criminosos; porque a tua Cabeça não podia separar-se do teu Corpo, já que significas a própria Unidade em Ti e fazes de nós, que te amamos, uma Unidade em Ti.

E não era ainda possível que te assassinassem consumindo-te pelo fogo, como tantas vezes fizeram a muitos que sofreram a justiça ou a injustiça dos homens, porque não vieste para destruir os corpos, mas para lhes prometer a purificação pela virtude e a glória pela ressurreição.

Nos mínimos pormenores da tua Vida e da tua Morte, encontramos misteriosos sinais que jamais ocorreram nem na Vida nem na Morte dos maiores dos homens a que a História do pensamento ou da ação humana se refere. Não foi, por certo, sem motivos divinos, que, entre tantos instrumentos de suplício, escolheram-te a Cruz.

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Excerto do 1º Capítulo (págs. 8 e 9) do Livro de Plínio Salgado, “A tua Cruz, Senhor... e outros escritos” – 1ª edição – Rio de Janeiro – Livraria Clássica Brasileira – 1954 – 245 págs.

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