Marcelo
Carvalho*
Cresce em nosso país um sentimento teofóbico que se manifesta
em atos provocativos de grupos e indivíduos contra a liberdade religiosa de
terceiros. Não deixa de ser uma situação paradoxal onde os que clamam pelo fim
do preconceito agem da mesma forma destilando preconceitos em suas
manifestações. Neste texto me limitarei aos atos de intolerância direcionados
aos católicos, mas que se aplicam igualmente aos cristãos em geral. Assim,
proliferam por toda parte atos provocativos como o “beijo gay” coletivo que foi
realizado ano passado em frente à catedral metropolitana de Florianópolis, ou a
recente invasão de uma igreja no Rio de Janeiro por uma mulher que mostrava os seios
e participava da tal “marcha das vadias”. Lamentavelmente, tais atos de
intolerância contra cristãos estão se repetindo com certa frequência em nosso
país, o que nos leva a refletir sobre o assunto.
De forma sutil, a teofobia está presente, também, na própria universidade.
Com efeito, recriminar a reitora e vice-reitora por terem solicitado a
celebração de uma missa de ação de graças pelo início da sua administração,
enfatizando na sua crítica que espera “que não haja conversões de última hora
ao deus de Abraão, Jacó e Isaac por conta da missa e menos ainda algum
sacrifício no altar do servilismo”, é atitude deselegante que demonstra pouca sensibilidade
com quem não “professa” o ateísmo. Afinal, o que haveria de errado se houvesse
alguma conversão? É nessa estranheza que reside o preconceito. Revela também um
aspecto do discurso intolerante e discriminatório de um ateísmo militante onde
o que está sendo posto não é a afirmação positiva do ateísmo daquele que faz a
crítica, mas a intenção de cercear a liberdade da manifestação religiosa dos
outros. Sem problemas, enquanto isso se limitar a uma mera opinião e não se
transformar em ações provocativas e discriminatórias como as mencionadas no
parágrafo anterior. O problema, contudo, vai além disso. Se tal teofobismo não
for combatido pela raiz, corremos o risco de deixar de fazer o bem àqueles que
desesperadamente procuram ajuda. Vejamos o caso da pastoral universitária que
atende na paróquia da Santíssima Trindade. Há uma demanda constante por parte
de alunos e pais que procuram os serviços oferecidos na igreja em busca de
orientação para os problemas típicos da vida universitária. São alunos que,
repentinamente, têm que morar sozinhos e, diante das dificuldades do curso e da
nova situação em que se encontram, muitas vezes recorrem ao vício do álcool e
das drogas. Outros simplesmente estão desmotivados e, quando não se rendem ao
desânimo e à depressão, não querem mais estudar gastando suas energias em festas
intermináveis ou em militância de partidos políticos fazendo mera agitação
estudantil. Aqueles que despertam para a seriedade da própria condição onde
encontram ajuda? Uma parte procura a pastoral universitária. Nesse contexto,
nada mais racional que a administração da universidade una esforços ao trabalho
assistencial de quem quer que seja na sua missão de ajudar quem os procura,
independente de credo e condição social. Sim, mas dirão os teofóbicos que, como
eles são da igreja católica e a universidade é laica, tal união de forças não pode
ocorrer. Ora, se os que criticam não propõem solução que deixem os outros
fazerem o que precisa ser feito. Do contrário, sua única motivação será mesmo uma
cruzada teofóbica.
Há pessoas que abusam de um discurso pretensiosamente acadêmico
demonstrando receio de que questões religiosas se constituam numa “investida
contra o Estado desfigurando-o de sua laicidade e tornando-o um instrumento de
opressão de consciências, julgando ser “de fundamental importância que a
universidade – denominada nos países hispânicos de a Máxima Casa do Saber – seja
demasiadamente lúcida na separação entre o laico e o religioso. Nem se quer um
culto ecumênico deveria acontecer”. O receio é pertinente, mas contraditório
quando fala de opressão de consciências, principalmente se quem discursa é um
simpatizante do marxismo, fanatismo doutrinário que, travestido de científico
mas adotando uma dinâmica tipicamente religiosa e apoiado em “crenças” como o
materialismo histórico, conseguiu o nível máximo de opressão das consciências com o comunismo e
ainda hoje fomenta um sectarismo perigoso quando se encastela na universidade
sob as mais diversas formas com finalidade de doutrinação. Só assim podemos entender a existência de um instituto
como o IELA que pensa a América Latina unicamente sob a ótica marxista. (Seria útil sabermos a fonte de financiamento deste
instituto).
Voltemos ao teofobismo. O fato é que ele aponta o risco da utilização
do laicismo como instrumento de coerção a qualquer expressão religiosa. Com
efeito, há povos cuja identidade está profundamente arraigada na religião e que
historicamente sofreram a investida do Estado tentando limitar sua identidade
religiosa em prol de um laicismo extremado. O bom povo mexicano experimentou e
sobreviveu a esta investida quando, mesmo submetido ao ateísmo momentâneo das
ondas revolucionárias, nunca deixou de afirmar sua devoção a Nossa Senhora de
Guadalupe, cuja imagem, estampada há mais de 500 anos na tilma do índio São
Juan Diego, reina imponente na catedral da basílica de Nossa Senhora de
Guadalupe. Esta violência revolucionária, que fracassou em destruir o
sentimento religioso do povo mexicano (bem como a tilma), se configura de forma
precisa nos “Povos” a que se refere o profeta Isaías em 8, 9-10: “Povos, fiquem
sabendo que vocês serão derrotados. Atenção, países distantes: armem-se quanto
quiserem que vocês sairão derrotados; façam planos a vontade que fracassarão;
façam ameaças: elas não se cumprirão, porque Deus está conosco.” O povo
mexicano, movido pela ação inspiradora do Espírito Santo na história, de forma heroica,
atualizou mais uma vez esta eterna profecia.
*∑. Florianópolis (SC). Professor do Departamento de
Matemática
Publicado originalmente no “Jornal do Sindicato dos
Professores das Universidades Federais de Santa Catarina (Apufsc-Sindical)
Florianópolis, 09 de Julho de 2012, nº 774, pág. 2.
3 comentários:
Prezado Sérgio
Desde agora pretendo me manter atualizada acerca de seus artigos, que muito alento me trouxeram por ressonarem com uma necessidade interna não correspondida pelas informações sub-reptícias na Internet. Quanto à página do Sr. Barbuy, a Seção de História foi a que mais me instigou.
Parabéns pelo trabalho.
Isadora Sarmento
Prezado Vasconcelos,
Encontrei grande alento em seu trabalho por este haver ressonado com uma antiga necessidade interior não correspondida pelo prolífico, vão e repetitivo material disponível acerca de pensamento político na Internet.
Desde agora sua admiradora e leitora,
Isadora Sarmento
Prezada Isadora.
Grato pelas elogiosas palavras e pelo incentivo.
Anauê!
Sérgio.
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